A atual crise do IPE Saúde, uma das mais graves da sua história, é atribuída por entidades sindicais de servidores públicos a um suposto descaso do governo Eduardo Leite com o plano de saúde que garante atendimento a cerca de 1 milhão de pessoas no Rio Grande do Sul.
Entre as causas, são apontadas a estagnação da receita do instituto ante o crescimento das despesas, a suposta politização das decisões, o fim da paridade da gestão entre governo e servidores e o atraso no recolhimento das contribuições patronais, de responsabilidade do governo.
O instituto deve R$ 1,1 bilhão para hospitais e clínicas pela prestação de serviços médicos aos usuários. Na semana passada, a Federação das Santas Casas e Hospitais Filantrópicos e a Federação dos Hospitais (Fehosul) protocolaram comunicação alertando o IPE Saúde e o governo estadual para o risco de rescisão de contratos e suspensão do atendimento aos segurados. Essa hipótese, se concretizada, prejudicará cerca de 10% da população gaúcha.
- Imagina colocar mais 1 milhão de pessoas no SUS? Vai ser um colapso - alerta Sérgio Arnoud, presidente da Federação Sindical dos Servidores Públicos (Fessergs).
A estagnação da receita é uma das causas mais citadas para a derrocada. O dinheiro que ingressa na instituição para pagar despesas é gerado a partir do repasse de 3,1% do salário de cada segurado. Por cada servidor, o governo faz uma contribuição paritária, de igual valor e alíquota. Todo o montante vai para o Fundo de Assistência à Saúde (FAS). Como vários setores do serviço público estão sem correção salarial desde 2015, a alíquota incide sobre os mesmos valores, defasados ante à inflação.
- Parte da solução é dar reposição salarial aos servidores. Isso vai elevar o dinheiro que entra - afirma Marcia Elisa Trindade, conselheira do IPE Saúde por indicação da Fessergs.
A partir de 2018, ainda no governo de José Ivo Sartori, foram aprovadas mudanças na estrutura do instituto, separando a parte da saúde do instituto que cuida da previdência.
Surgiu, então, o IPE Saúde. Nesse novo formato, os funcionários apontam o fim da gestão paritária - na qual os quatro diretores do IPE eram indicados pelos servidores e pelo governo. Atualmente, o governo indica todos os diretores. Para as categorias do funcionalismo, isso tornou o órgão mais propenso a decisões políticas e a cobrança pelos repasses do Estado para quitar pendências nas cotas patronais foi suavizada.
- Quando a gestão era paritária, todos os diretores tinham o mesmo peso na hora de votar. Era mais complicado de o governo intervir - relata Antônio de Pádua Vargas Alves, ex-diretor de Saúde do IPE, indicado pelos servidores, entre 2012 e 2016.
Outro lado
Os representantes dos servidores são unânimes ao apontar que o governo estadual está atrasando o recolhimento ao FAS das cotas patronais de 3,1% sobre o salário de cada servidor segurado. O FAS, nessa situação, não consegue somar quantia considerável de reserva. Após publicação dessa matéria em GZH ontem à noite, o governo negou ter atraso na quitação das cotas patronais de 3,1%. A direção do IPE Saúde diz que os repasses estão em dia desde 2021, com aporte extra de R$ 200 milhões apenas para a reposição de cotas patronais atrasadas que eram de quase uma década.
Além disso, a pandemia de coronavírus e o aumento da demanda por internações e serviços de UTI são apontados como causadores de despesas adicionais que não teriam sido cobertas a contento pelo Palácio Piratini. A reportagem questionou a direção sobre a questão e aguardava resposta até as 21h de ontem.
Ontem, o IPE Saúde, em nota, informou que está em negociação com os hospitais para assegurar a continuidade dos atendimentos aos usuários. Uma nova reunião estava prevista para esta semana.
"Estamos trabalhando com as instituições hospitalares para a construção de uma solução que seja adequada a todos os envolvidos, dentro de um contexto de reequilíbrio", afirmou o atual presidente do IPE Saúde, Bruno Jatene, que assumiu o cargo há poucos dias.