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Participação das mulheres na política ainda é desafio

Escrito por Vanessa Ferraz / Jornal do Comércio13 de Jan de 2022 às 10:37
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Em 2021 foi criada a Bancada Feminina no Senado / Foto: Marcos Oliveira / Agência Senado.
 
 

Poder votar e ser votado, participar de partido político, ter participação e influência nas atividades de governo são algumas garantias que compõem os direitos políticos de um cidadão. Há 87 anos, as mulheres garantiram esse direitos na constituinte de 1934. No entanto, se o voto é um ato importante e simples de ser feito, a candidatura é algo bem mais complexo. Para que esses direitos políticos se traduzam na realidade, as mulheres precisam estar inseridas no poder de decisão, e por isso, há 24 anos, que a legislação nacional vem sofrendo mudanças para que a representação feminina aconteça de fato.

A lei das eleições (N°. 9504/1997) estabeleceu que os partidos políticos deveriam prever 30% das suas candidaturas para as mulheres. Não ter a obrigação de destinar essas vagas não traduzia o esforço e o incentivo a essas candidaturas, então 12 anos depois, houve uma alteração com a lei n° 12.034/2009 que determinou que a proporção de candidaturas entre gêneros, deveria ser obrigatoriamente de no mínimo 70% e 30%.

Como as candidaturas femininas sempre estão em menor número, essa lei é conhecida popularmente como a que destina cotas de 30% de reserva para as mulheres. Todavia, o Tribunal Superior Eleitoral, em 2019, entendeu que somente a obrigatoriedade das vagas não eram suficientes, se não houvesse também o repasse de recursos para o financiamento dessas candidaturas.

Então, na Resolução TSE nº 23.609/2019, os partidos políticos ficam obrigados a destinar 30% dos recursos vindos do Fundo Partidário para o financiamento de campanhas das suas candidatas. E não só isso, também estipulou que o tempo de rádio e televisão na propaganda eleitoral obrigatória também deveria receber a mesma proporção. No caso, de haver uma proporcionalidade maior de candidaturas, por conseguinte, os números de recursos e propaganda seriam proporcionais.

Com possíveis efeitos da mudança da legislação, segundo os dados do TSE, o pleito de 2020 para prefeitos e vereadores apresentou um pequeno avanço na representatividade. Porto Alegre, que ganha o primeiro lugar entre as capitais com maior representação feminina na Câmara Municipal, com 30,55% do quórum, representado por 11 vereadores do total de 36 lugares, apresentando aumento considerável em relação às eleições de 2016 que tinham 4 mulheres eleitas. Já nas prefeituras, foram 37 prefeitas eleitas no primeiro turno, frente a 24 (em 2016), no Estado.

A situação regional se destaca nos avanços quando o comparativo é feito em nível nacional, em 2016, as mulheres eleitas para prefeitas somaram 11,57% dos municípios brasileiros, em 2020 foram 11,8%, ou seja a média de 658 eleitas, em relação ao número total de municípios que são 5.570. Ao invés de avanço, houve pequena queda.

Candidaturas femininas estão na mira dos partidos

A obrigatoriedade vinda da legislação eleitoral, tanto de reserva de vagas como de recursos para as candidatas mulheres de cada partido, bate à porta das siglas a menos de um ano das eleições de 2022. Quanto maior for a legenda, maior será o número de vagas que terão de ser ocupadas  por elas. As quatro maiores bancadas da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, fomentam através das suas representantes femininas, ações para atrair interessadas.
O Partido Democrático Brasileiro (MDB), ocupa oito cadeiras no Legislativo do Estado. Em 2018, eram todos homens, quando o então deputado estadual Sebastião Melo (MDB), ganhou a disputa pela prefeitura de Porto Alegre, em 2020.
Com isso, o lugar foi ocupado pela suplente Patrícia Alba, que é presidente do MDB Mulher RS, e vice-presidente do segmento em nível nacional. A deputada estadual, conta que o trabalho feito, através do setor que também coordena, é realizado constantemente. "Realizamos muitos encontros do Conexão Mulher, de forma online, e ali a gente se conhece, questiona, e se apoia no que é preciso", relata.
"Na última eleição tivemos um avanço em 20% de vereadoras eleitas no RS, mas isso é algo que construímos passo a passo porque a política ainda é muito masculina", expõe. Tendo o
nome da senadora Simone Tebet (MDB), como a única mulher a ter sido cotada como possível candidata à presidência no próximo ano, Alba afirma que a senadora é uma liderança  incontestável do partido hoje.
Outro partido que também ocupa oito cadeiras no legislativo gaúcho, é o Partido dos Trabalhadores (PT), e a sua representação feminina é através da deputada estadual Sofia Cavedon. A deputada relata que motivar as vozes femininas dentro de uma legenda passa por várias ações: "O PT, foi o primeiro partido que adotou a equidade de gênero em todas as direções", explica. A secretaria nacional do PT Mulher desenvolve um programa chamado Elas por Elas que promove capacitações, visibilidade, produção de materiais e encontros entre as filiadas. A eleição da nova direção da secretaria em nível regional, reuniu 300 mulheres, na primeira semana de novembro. "Para participar da política é preciso fazer política desde sempre, e com a ajuda de algumas políticas públicas, a mulher passou a fazer parte dessa construção, apesar de ainda haver muitos freios", explica Cavedon.
Já o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), soma cinco cadeiras no Parlamento, e conta com a presença feminina da deputada estadual Kelly Moraes, que tomará posse da presidência do PTB Mulher no Estado. "O nosso desafio é buscar candidaturas, o partido está forte, a nossa meta é ter mais mulheres eleitas no próximo ano", assegura. Com a confirmação que tentará a reeleição para o legislativo, a deputada revela que o início da programação será no dia 4 de dezembro em encontro estadual do partido em Porto Alegre. "Antigamente existia uma grande resistência da mulher acreditar nela mesma, agora sinto que isso está mudando", comentou.
O Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), conta com quatro lugares, sendo que um é ocupado pela deputada estadual Zilá Breitenbach. "Quando assumi o PSDB Mulher, coloquei como slogan 'Mulheres Construindo e Fortalecendo a Democracia'", manifesta a deputada. Após ter 700 mulheres candidatas a vereadora (em 2020), e ver algumas desistir da política depois da derrota, a deputada assumiu o compromisso de promover encontros a cada 15 ou 20 dias, para continuar estimulando e apoiando as filiadas. "O apoio é não enxergar a mulher só na véspera da eleição, agora começa a correria todo mundo atrás de mulher", comenta. A construção das candidaturas é feita no dia-a-dia partidário, mas também, é uma busca por espaço da própria mulher, alerta a congressista.

Maioria masculina é constituição histórica

A forma como a sociedade brasileira constituiu sua organização e sua cultura espelha as decisões e os comportamentos dos seus cidadãos. Pensando a partir da sub-representação feminina na política, a socióloga e doutoranda do Grupo de Pesquisa Violência e Cidadania (GPVC) da Ufrgs, Suelen Gonçalves, considera dois pilares sociais que ainda sustentam essa diferença: o primeiro está ainda na desigualdade (entre gênero) do acúmulo de jornadas múltiplas que a mulher desempenha em comparação ao homem; e o segundo pilar, estaria na concepção ainda preservada do poder de decisão do homem branco herdada do período escravocrata.
Sendo a maioria da população e do eleitorado, as mulheres enfrentam barreiras visíveis e invisíveis ao ocupar posições de poder, mas também, conquistam avanços: "O financiamento público para essas campanhas, resultou na diversidade que vimos em 2020", refere a especialista. O capital político e econômico é determinante e indispensável na construção do legado tanto das candidaturas como das plataformas eleitorais, quando esse "poder" é distribuído, alguns bloqueios passam a ser quebrados.
Todavia, o problema não está somente em conquistar a posição no Executivo ou nos parlamentos. Na posse, as eleitas encaravam situações como falta de banheiro feminino em algumas casas legislativas, a demora na regulamentação da licença maternidade e também a insegurança. Suelen, conta que era amiga pessoal da vereadora Marielle Franco (vítima de assassinato em 14 de março de 2018) e que acompanhou as ameaças e a falta de ação da Câmara Municipal do Rio de Janeiro em garantir a segurança da parlamentar, em contraste com a segurança que é dada até hoje para vereadores homens que também foram ameaçados em razão da CPI das Milícias.
Uma das funções dos setores dos partidos voltados às mulheres é o apoio às suas candidatas eleitas, nos exercícios dos mandatos. As deputadas relatam que tem circunstâncias onde as setoriais interferiram em situações de discriminação e de diferença de oportunidades entre homens e mulheres em cargos iguais.

   

 

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