A Comissão Especial sobre a Crise nas Finanças e Reforma Tributária, da Assembleia Legislativa, aprovou nesta quinta-feira (16) o relatório que recomenda ao governo do Estado que, antes de aderir ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF), cobre esclarecimentos da União sobre a legalidade da dívida. O relatório de 104 páginas do deputado estadual Elton Weber (PSB) foi aprovado com sete votos favoráveis e um contrário. O colegiado ouviu os últimos oito governadores do Rio Grande do Sul sobre a crise financeira, além de outros especialistas.
Em seu relatório, Weber aponta vários indícios de irregularidades na dívida com a União - da qual o Estado já pagou cerca de R$ 40 bilhões (quatro vezes mais do que os R$ 9,5 bilhões contratados em 1996) e segue devendo mais de R$ 70 bilhões (seis vezes mais do que o contratado). Inclusive, alguns ex-governadores - como Antônio Britto (MDB, 1995-1998), por exemplo - reconheceram que a dívida é impagável, no formato em que está. Hoje a dívida com a União, aponta o relator, corresponde a 85% do endividamento total do Rio Grande do Sul.
Entre as possíveis irregularidades, o relator aponta a cobrança de juros sobre juros; a aplicação de juros sobre o saldo residual, em contrariedade a legislação federal vigente; e a retroatividade do índice de correção, alterado durante o curso do contrato.
No caso da cobrança de juros sobre juros, a legalidade desse item já foi questionada na Justiça pelo ex-governador José Ivo Sartori (MDB, 2015-2018). A partir desse questionamento judicial, em 2017, o Supremo Tribunal Federal (STF) concedeu a liminar que suspendeu o pagamento das parcelas mensais da dívida com a União - suspensão que está vigente até hoje. Se o Estado aderir ao RRF, terá que abrir mão dessa ação judicial. Nesse período, o Estado deixou de pagar R$ 15 bilhões, valor que está se acumulando, mês após mês, no estoque da dívida.
Diante dos indícios de irregularidades, Weber cobra explicações da União. Por exemplo, qual foi o custo que o governo federal teve, ao assumir os mais de R$ 9,5 bilhões da dívida do Estado. Com isso, seria possível averiguar se os custos que a União teve já foram cobertos.
Além dos esclarecimentos sobre o débito com a União, o relator recomentou outras três ações: a criação de uma Frente Parlamentar para acompanhar o debate nacional sobre a Reforma Tributária e seus desdobramentos no Estado e municípios; durante a discussão da reforma tributária, pressionar pela revisão da Lei Kandir; e construir um plano de desenvolvimento de longo prazo para o Estado, a partir de uma ampla discussão com a sociedade civil e partidos políticos.
"A dívida é impagável nas atuais condições contratuais. Não queremos perdão, queremos, sim, a compensação justa das perdas, recursos que estamos deixando de investir no Estado", avaliou Weber.
O presidente da comissão, Luiz Fernando Mainardi (PT), acredita que o RRF não é a solução para os problemas financeiros do Rio Grande do Sul. "Nossa dívida não vai desaparecer, apenas ficaremos sem pagá-la durante um tempo. Os juros seguirão e o saldo vai crescer. Será uma 'barrigada', algo que pode até resolver a gestão fiscal de curto prazo, mas vai prejudicar, e muito, os governos futuros".
E acrescentou: "para lançar mão disso (adesão ao RRF) só se realmente não houvesse alternativas. Mas estamos demonstrando, com este relatório, que elas existem".
Na semana passada, foi aprovado o relatório de outra comissão especial da Assembleia - que acompanhou as negociações para a adesão do Rio Grande do Sul ao RRF. Nessa comissão, presidida pelo líder do governo, Frederico Antunes (PP), o relatório recomendou o ingresso no regime. Entre os benefícios apontados com a entrada no RRF, o texto cita a autorização para novos financiamentos e a suspensão do pagamento da dívida por até 10 anos (com a volta do pagamento de forma gradual).