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50 anos de O Mito do Desenvolvimento Econômico

Escrito por João Neutzling Jr.*01 de Mai de 2024 às 10:27
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O economista Celso Furtado (1920-2004) foi um notável analista da realidade social da América Latina que soube interpretar e demonstrar as contradições do sistema capitalista global. Doutor em Economia pela universidade de Sorbonne – Paris em 1948, foi o primeiro superintendente da SUDENE (Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste) em 1959, e primeiro ministro do Planejamento do Brasil em 1962.

Já havia escrito inúmeros livros sobre economia quando sobreveio golpe de 64, teve seus direitos políticos e civis cassados tendo partido para o exílio. Foi professor em Paris onde aprofundou seus estudos sobre a economia mundial. Neste período publicou, em 1974, há 50 anos, um livro seminal “O Mito do Desenvolvimento Econômico”.
Nesta obra, o autor afirmava que o desenvolvimento econômico, como estágio evolutivo da história, seria factível apenas para alguns países do Primeiro Mundo (a elite capitalista), mas um mito impossível de se realizar para a maioria dos países do Terceiro Mundo. Por qual motivo? Pela exaustão dos recursos naturais, poluição do meio ambiente e consumo de combustíveis fósseis.
O aquecimento global, ora em curso no planeta, é o processo de aumento contínuo da temperatura média do planeta decorrente da emissão de gases oriundos da queima de combustíveis fósseis (petróleo entre outros). Esta questão já havia sido tratada no estudo The Limits of Growth do MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts) para o Clube de Roma em 1972 quando se alertou sobre o conflito crescimento econômico X escassez de recursos naturais.
Segundo estudo do Fundo Mundial para a Natureza (WWF), os EUA são o país que mais produz resíduos sólidos (lixo), em média 773 quilos por habitante/ano, mais de três vezes mais que a média mundial (257 quilos) e sete vezes mais que a Etiópia, um dos países mais pobres do mundo, com 110 quilos/habitante. Ou seja, quanto maior a renda per capita maior é a poluição ambiental.
Se toda a população mundial (oito bilhões de pessoas!) tivesse o poder de consumo dos EUA (ou outro país de alta renda per capita) a vida na terra seria impossível haja vista a poluição, produção de lixo e consumo dos recursos naturais até a exaustão.
Nesta obra, Furtado confirmou o que já tinha sido teorizado antes pelo economista inglês Thomas Malthus (1766-1834) que afirmava estarem os meios de subsistências crescendo em progressão aritmética enquanto a população crescia em progressão geométrica. Logo haveria uma incompatibilidade entre a demanda agregada global e a oferta de recursos.
O degelo das calotas polares é fenômeno derivado do aquecimento da temperatura global que por sua vez decorre da produção de gases das indústrias em todo o planeta, o efeito estufa.
O autor ainda acrescenta que o subdesenvolvimento não é uma etapa histórica pela qual todos os países tem que passar, mas sim uma consequência do desenvolvimento das nações industrializadas que dominam a tecnologia mundial de produção enquanto que os demais países são meros fornecedores de matéria-prima e mão de obra barata. Basta ver as maquiladoras mexicanas que abusam dos baixos salários e normas ambientais pífias.
Esta hipótese encontra consonância na famosa teoria do ciclo-produto de Raymod Vernon (1966) segundo a qual novos produtos são desenvolvidos nos países centrais que dominam a pesquisa científica. Depois que um novo produto é padronizado ele pode ser fabricado em qualquer indústria do terceiro mundo sem gerar desenvolvimento local.
Neste diapasão, obras como “Os estágios do crescimento econômico – um manifesto não-comunista” (The Stages of Economic Growth: A Non-Communist Manifesto) de Walt W. Rostow,1960, são apenas “conversa para boi dormir”.

Estes estágios do desenvolvimento que Rostow cita são 1)Sociedade Tradicional, 2) Pré-condições para o Arranco, 3) O Arranco (Take-off), 4) A Marcha para a Maturidade e  5) A Era do Consumo em Massa são apenas uma teorização muito infantil do processo de desenvolvimento que é dominado pelos países centrais sem possibilidade de as nações periféricas conseguirem participar do processo de forma autônoma.
Haja vista a atual briga entre EUA e China pelo controle da produção de chips de computadores e semicondutores de alta tecnologia. Da mesma forma, os EUA estão pressionando seus parceiros comerciais a banirem os equipamentos da Huawei, empresa chinesa está na dianteira da nova tecnologia de 5G.

Furtado concluiu que haveria um fosso entre as economias industrializadas do centro e as economias periféricas decorrente da própria natureza do sistema capitalista mundial. E ele estava absolutamente certo em suas análises.
Ler e reler a obra de Celso Furtado é um exercício intelectual que nos mostra a realidade nua e crua do mundo em que vivemos e suas contradições.

*Economista, Bacharel em Direito, Mestre em Educação, Auditor estadual, Professor e Escritor. (jntzjr@gmail.com)

 

   

 

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